Linhas e Fotografias

(Imagem : Martim Whatson)
Vera era feliz com o que não tinha. A deceção era uma esquisita flor que fazia girar por entre  finíssimos dedos.

“ Os lábios se tocaram. Foram sentindo o gosto um do outro: o dela era paixão. Já o dele, de adeus.”



- Edson Rossato
 

JUDITE



Chamava-se Judite e tinha no cabelo um vigor apreciável. Usava-o por cima do pescoço com caracóis largos, esvoaçantes. Ainda assim, a figura era sumida. Quando deparávamos de caras com o seu rosto, uma paisagem começava a morrer. Voltando a atenção para os olhos, reacendia-se a primavera. Deixava as amigas nos aposentos da idade ditada pelo preconceito, calçava os sapatos de salto alto cor de vinho, vintage, e saia saia. Gostava de ir para aquele café de superfícies planas a refletirem os fenómenos onde a luz das estações do ano entrava pelas vitrines. Bebia cafés longos e espumosos em chávenas transparentes, às vezes comia torradas ou tartes de framboesa. Por ali desfilava gente jovem com uma excentricidade contida ou um equilíbrio clássico assumido. Mas o que mais a deliciava – sim, aquela abertura de lábios era de regozijo – eram os modos aveludados de Ricardo a pontuar as frases com “meu bem”, “minha querida” enquanto adivinhava o que lhe iria servir naquele dia. Depois lançava-se no sofá da sua casa deixando a alma flutuar em musicas brasileiras cheias de sentimento. Um dia cruzou-se com o rapaz a atravessar a passadeira. O coração foi bruscamente impelido a saltar para dentro dos olhos dele mas esbarrou violentamente perante um cumprimento distante, seco. Ricardo estava fora da hora de expediente. Levava uns jeans com rasgões francos no meio da perna (lá isso é verdade, não parecia o mesmo). Nesse dia Judite resolveu ir visitar uma amiga de longa data e calçou os chinelos de enfiar o dedo. De cabelo bambaleante e a trocar as voltas nos contrastes de si mesma, seguiu ligeira.

Por dentro das coisas há mar. E lágrimas nos olhos dos peixes.
(…) “ A vida é uma bebida pura – um prazer forte, um sofrimento intenso, direto, cem por cento.”

- Chögyam Trungpa

"Renasce em ti mesmo.
Multiplica os teus olhos, para verem mais.
Multiplica-se os teus braços para semeares tudo.
Destrói os olhos que tiverem visto.
Cria outros, para as visões novas.
Destrói os braços que tiverem semeado,
para se esquecerem de colher.
Sê sempre o mesmo.
Sempre outro. Mas sempre alto.
Sempre longe.
E dentro de tudo."

- Amber Carlo Privizzini vs Cecília Meireles
Por entre o bem e o mal passa a vida.
(...)
“Eu aprendi a andar. Desde então, passei
por mim a correr.
Eu aprendi a voar.
Desde então, não quero que me empurrem
para mudar de lugar.
Agora sou leve, agora vôo, agora vejo por baixo
de mim, agora um Deus dança em mim!”



-Friedrich Nietzsche


"Be silent! Be silent! For love behaves contrary to normal here the meaning hides itself if you talk too much (...)”

-André Kertz vs Rumi

no alto silêncio de nós,
nos corredores desertos de nós.”

- Matthieu Ricard vs Vergílio Ferreira
"Algures para lá do certo ou do errado, há um jardim. Lá me encontrarei contigo."

 - Miguel Saavedra vs  Rumi



Secretamente o inverno é uma estação quente.
Acordo semi lúcido,
entre a morte e a morte,
relembrando onde perdi a minha língua atrevida
pelas mortes,
pelas vidas,
pelas avenidas,
pelas Ave Marias cantadas em coro no meu violão.
pelas ruas sem chão!
Meu corpo tem dois mil e tantos cavalos calados.”

(…)

- Raul Seixas
“ Às vezes eu amo e construo castelos, às vezes eu amo tanto que tiro férias e embarco num tour pro inferno.”

- AgNews vs Cazuza ( Gisele Tité e Emilio Dantas)

Cazuza por autor desconhecido

(...)

"Meu caminho nesse mundo, eu sei
Vai ter um brilho incerto e louco
Dos que nunca perdem pouco
Nunca levam pouco
Mas se um dia eu me der bem
Vai ser sem jogo"

(...)

-  Cazuza

https://www.youtube.com/watch?v=YshCnyDdmNA
“Tudo aparece desaparecendo.”



- Chris Marker vs Paulo Borges

(…)
“Prostituição é venda do sexo. Sexo é corpo. E toda a gente vende aptidões do corpo para ganhar a vida. O futebolista ganha a vida pelo seu pé. A cantora pela sua voz. O carregador pelos seus braços e força. E as prostitutas? Será que elas não têm o mesmo direito de ganhar a vida pelo seu corpo ?
Trechos da Bíblia correm na mente extralúcida.
Na hora da sentença original, Deus disse:
… produzir-te-á espinhos e abrolhos e comerás a erva dos campos. Comerás o pão com o suor do teu rosto... e ao pó hás-de voltar.
Oferecer o corpo a qualquer um é mais espinhoso e mais amargo que o abrolho. Amor vendido e amor comprado produzem o suor do rosto. Prostituta é barro, erva, qualquer um compra-a, usa-a.
Porque prendemos as prostitutas, então? Porque as deportámos e maltratámos?”
(…)

- Vee Speers vs Paulina Chiziane