“Limpa as dedadas
das paisagens e dos caminhos por onde passaste e não digas mais
nada.”
- Adriana Lestido
vs Verónica Louise
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Linhas e Fotografias
(Imagem : Martim Whatson)
"O amor de alguém é
um presente tão inesperado e tão pouco merecido que devemos
espantar-nos que não no-lo retirem mais cedo. Não estou inquieto
por aqueles que ainda não conheces, ao encontro de quem vais e que
porventura te esperam: aquele que eles vão conhecer será diferente
daquele que eu julguei conhecer e creio amar. Não se possui ninguém
(mesmo os que pecam não o conseguem) e, sendo a arte a única forma
de posse verdadeira, o que importa é recriar um ser e não
prendê-lo. Gherardo, não te enganes sobre as minha lágrimas: vale
mais que os que amamos partam quando ainda conseguimos chorá-los. Se
ficasses, talvez a tua presença, ao sobrepor-se-lhe, enfraquecesse a
imagem que me importa conservar dela. Tal como as tuas vestes não
são mais que o invólucro do teu corpo, assim tu também não és
mais para mim do que o invólucro de um outro que extraí de ti e que
te vai sobreviver. Gherardo, tu és agora mais belo que tu mesmo.
Só se possuem eternamente os amigos de quem nos separamos."
- Marguerite Yourcenar
Só se possuem eternamente os amigos de quem nos separamos."
- Marguerite Yourcenar
JUDITE
Chamava-se Judite e
tinha no cabelo um vigor apreciável. Usava-o por cima do pescoço
com caracóis largos, esvoaçantes. Ainda assim, a figura era sumida.
Quando deparávamos de caras com o seu rosto, uma paisagem começava
a morrer. Voltando a atenção para os olhos, reacendia-se a
primavera. Deixava as amigas nos aposentos da idade ditada pelo
preconceito, calçava os sapatos de salto alto cor de vinho,
vintage, e saia saia. Gostava de ir para aquele café de
superfícies planas a refletirem os fenómenos onde a luz das
estações do ano entrava pelas vitrines. Bebia cafés longos e
espumosos em chávenas transparentes, às vezes comia torradas ou
tartes de framboesa. Por ali desfilava gente jovem com uma
excentricidade contida ou um equilíbrio clássico assumido. Mas o
que mais a deliciava – sim, aquela abertura de lábios era de
regozijo – eram os modos aveludados de Ricardo a pontuar as frases
com “meu bem”, “minha querida” enquanto adivinhava o que lhe
iria servir naquele dia. Depois lançava-se no sofá da sua casa
deixando a alma flutuar em musicas brasileiras cheias de sentimento.
Um dia cruzou-se com o rapaz a atravessar a passadeira. O coração
foi bruscamente impelido a saltar para dentro dos olhos dele mas
esbarrou violentamente perante um cumprimento distante, seco. Ricardo
estava fora da hora de expediente. Levava uns jeans com
rasgões francos no meio da perna (lá isso é verdade, não parecia
o mesmo). Nesse dia Judite resolveu ir visitar uma amiga de longa data
e calçou os chinelos de enfiar o dedo. De cabelo bambaleante e a
trocar as voltas nos contrastes de si mesma, seguiu ligeira.
"Renasce
em ti mesmo.
Multiplica
os teus olhos, para verem mais.
Multiplica-se
os teus braços para semeares tudo.
Destrói
os olhos que tiverem visto.
Cria
outros, para as visões novas.
Destrói
os braços que tiverem semeado,
para
se esquecerem de colher.
Sê
sempre o mesmo.
Sempre
outro. Mas sempre alto.
Sempre
longe.
E
dentro de tudo."
- Amber Carlo Privizzini vs Cecília Meireles
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